sexta-feira, 4 de abril de 2008

O corcel não-alado, parte I - ascenção e queda

Cómico Maléfico,

Venho desta feita relatar-lhe mais um daqueles episódios que nos acontecem frequentemente, a nós que nos entregamos com total devoção às práticas malignas e que praticamos inconscientemente as entregas demoníacas. Acontecem mais a mim do que a si, mas acredito que seja apenas pelo facto de que o prezado colega não faz delas notícia, enquanto eu tenho este gosto de partilhar a riqueza das experiências vividas durante a nossa negra labuta.

Como será eventualmente do seu conhecimento, recentemente adquiri de forma totalmente gratuita, um aparelho de locomoção bi-rodado. Digo de forma gratuita, porque de facto não despendi nenhuma quantia monetária para o poder comprar, ie, o acto da compra foi oferecido apenas tive que pagar o bólide em questão.

Este poderoso corcel metálico, apesar da sua proveta idade e aspecto um pouco decadente, pareceu-me desde o primeiro momento em que o visionei, como o aliado ideal para espalhar o mal e sofrimento. Só é pena não ser alado como os corcéis do Inferno, mas em compensação o enorme baú recheado de riquezas que entreguei à guarda da entidade que fez a transacção, esse sim, ganhou asas e voou rapidamente para longe da minha vista e provavelmente para todo o sempre.

Mas como dizia, foi possível percepcionar desde o segundo instante (no 1º eu não estava bem a perceber o que aquilo era), que estava perante mais uma das criações do Demo, postas na terra para infernizar a vida dos homens (mulheres, crianças, idosos, tudo o que mexa e se meta à frente dela…).
E adivinhe quem foi a 1ª vítima da maldade pérfida do corcel não-alado? Adivinhou. Fui eu próprio.

Uma bela manhã de um destes dias que não sendo o de amanhã era posterior ao de ontem, com o astro solar a reinar nos céus e com a boa disposição a pairar pelo éter, coisa que a mim me deixa particularmente afectado e de má disposição, resolvi que era chegado o momento de libertar a fúria destrutiva do tenebroso e locomotivo aparelho infernal.
Pleno de confiança e bastante nervoso com o medo de cair ao chão, coloco toda a parafernália de equipamento de protecção (meros itens de adorno para mim, como sabe a minha pele é mais rija que o aço) e dou o sinal que colocou em acção toda a mecânica brutal de tão possante artefacto andante.
O corcel solta um rugido rouco e gutural, que me deixa perplexo de espanto, visto que tratando-se de um corcel esperaria um relincho. Mas vendo bem, isso não seria muito assustador, por isso não liguei.
Sabendo da sofreguidão que o meu novo parceiro do Mal tinha em iniciar as praticas maqueavélicas, decido dirigir-me a um usualmente denominado posto de abastecimento, outras das invenções de génio do nosso Mestre, uma vez que aí consegue por as pessoas a pagarem para poluir.

Consegui atingir o meu objectivo primário sem sobressaltos de maior e sem quedas aparatosas. Não pude no entanto de deixar de reparar, na deferência assustada dos vulgares humanos à minha apoteótica aparição. Era vê-los, com os olhos raiados de terror a desviarem-se de qualquer forma, de modo a abrirem alas para a minha passagem. Ainda esbocei uns acenos de agradecimento, mas isso acabou por induzir uma ligeira queda nuns arbustos que por ali passavam. Mas nada que retirasse a dignidade aquele momento.

Chegado à bomba, após me ter desenvencilhado do equipamento que me atrapalhava mais do que protegia, e com uma voz de trovão emoldurada por um opus magnífico de buzinas dos veículos que me precediam na fila, vociferei estas palavras épicas para o pasmado interlocutor: “É 10 euros se faz favor!”.
E eis chegado o momento em que fui confrontado com o árduo teste que se aproximava. Após terminada a complexa operação de abastecimento (complexa porque implicou colocar novamente todo o equipamento que escusadamente tinha retirado), profiro as antigas palavras, o mantra satânico próprio deste ritual e simultaneamente carrego no misterioso botão com as enigmáticas inscrições “start”, e …. Nada! Rigorosamente nada foi o que se passou a seguir. O monstro das profundezas tinha-se calado e recusava-se terminantemente a por em movimento os pistões das suas entranhas.

Num crescente épico e glorioso das buzinas e perante um amedrontado pedido, feito em profunda reverencia pelo funcionário da dita bomba, que me rogou prostrando-se para que eu “desamparasse a loja…”, esquivo-me para um canto mais escondido e fico em profunda meditação e contemplação olhando para o vazio, sem ideia do que fazer. O meu aspecto, aparentemente catatónico, chamou a atenção de alguns transeuntes sendo que um deles disse “não anda? Chame o reboque!”. De repente fez-se luz no meu cérebro e tomei uma decisão temerária! Decidi chamar o reboque.
Mas qual reboque? Eu não tenho nenhum reboque, se não andaria de reboque no dia-a-dia. Assim teria sempre um quando precisasse dele. Muito básicos estes humanos.

Opto neste momento por fazer uma pausa e um breve interludio nesta narrativa. Em breve retornarei com a segunda parte desta saga epopeiaca.

Até breve Maléfico!
Mafarrico

4 comentários:

Maléfico Patético disse...

mafarrico,

é desumano que deixe tal narrativa a pairar pelo éter.

Gosto disso, e vou esperar pacientemente pelo final para me pronunciar.

M.P.

Brigite Silva disse...

Pois é meu caro Mafarrico... Pois é...

É que o meu senhor escreve certo por linhas tortas...

Ou se quiserem outro cliché vira-se o Mafarriço contra o Mafarrico...

A sua sorte... é até ter um certo jeito para episódiod e para a escrita humoristica caso contrário o meu senhor já o teria levado nas suas barbas...

Maléfico Patético disse...

mafarrico,

outra vez mafarrico?! sempre que vem com os seus relatos verídicos aparece um anjinho papudo a meter o nariz.

já me começa a fazer espécie. Vá lá termine este o quanto antes, para depois irmos aniquilar uns anjitos.

Sabe o que é um episódiod? Ouvi dizer que tinha um certo jeito para isso, o que quer que seja.

M.P.

\m/afarrico disse...

Pois de facto não faço ideia do que seja tal coisa. Penso ser dialecto proprio dessa especie alada e com penas, vulgarmente representados com vestes hospitalares.

Quanto ao seguimento da narrativa, acredite caro amigo, que se ainda não o fiz tal se deve a factos completamente alheios à minha vontade e também porque já não me lembro bem do que aconteceu.
Mas não passa de hoje. Talvez amanhã!
Até já!