sábado, 21 de agosto de 2010

O Inferno segundo os Coen

O hotel Earle, que acomoda Barton Fink, é um subtil, mas perfeito, simbolismo do Inferno. Brilhantemente apresentado a todos os que o ignoram.

"SIX please" - "next stop, SIX"
"this stop, SIX"

O slogan ("A Day or a Lifetime"), as boas vindas a um escritor com um lápis sem ponta, o empregado Chet que chega das profundezas, o ascensorista Pete e o seu conhecimento da bíblia ("I've heard about it."), a própria bíblia incapaz de dar qualquer conforto, a ausência de hóspedes e a presença de mosquitos ( "mosquitos breed in swamps; this is a desert") a demonstrar o quanto deslocado estamos da realidade, o final infeliz de todos os estranhos que visitam o hotel, enfim, todo o ambiente estranho e sobrenatural do gigantesco edifício.

E claro, Charlie, o demónio encarregado de infernizar o personagem principal, a personificação do homem comum (irónicamente vende seguros contra incêndios), um gigante simpático que deita pus por um ouvido infectado. A temperatura sobe quando ele aparece e as paredes descascam quando ele está por perto. Não será o retrato do nosso Maior, mas sim de um Demónio trabalhador, que só quer "ajudar" todos a libertarem-se das agruras da vida. Dá uma bela lição ao personagem principal, porquê? - "Because, you don't LISTEN!"


"I'll show you the life of the mind"

1 comentário:

\m/afarrico disse...

O ser humano, de natureza imperfeita e essencialmente estúpida, carece de orientação e de ícones que o alumiem no seu caminho para a decadência absoluta.
É portanto natural encontrar estas representações simbólicas, em que os seres aflitos pretendem materializar e dar uma imagem concreta a esse conceito abstracto e de difícil compreensão que é o Inferno, e que tanto conforto lhes traz apesar da estranheza desse sentimento.
Nós, selectos representantes do Grande Chifrudo, e que caminhamos por entre estes seres ignóbeis, acolhemos estas farsas com regozijo e complacência. Afinal de tudo, trata-se de formas de reconhecimento do nosso trabalho subversivo. Escarramos com altivez (e assim de lado) sobre tais manifestações culturais.
A película aqui dissecada, é de facto um bom exemplo do referido acima. Sem grandes clichés e recorrendo ao sempre desejável humor negro, consegue passar uma primeira sensação de desconforto mental e estranheza. Se a essa primeira vaga de sentimentos se seguir a análise atenta que o colega executou eximiamente, fica claro quem guiou a mente dos Coen.

"The hopes and dreams of the common man are as noble as those of any king. It's the stuff of life"